quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Exumação de D. Pedro I e suas duas mulheres


A análise feita com os restos mortais de D. Pedro I e suas duas mulheres, D. Leopoldina e D. Amélia, pode ajudar a impulsionar diferentes campos de pesquisa no Brasil, segundo professores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) que participaram do estudo. 

Nesta segunda-feira (18), a arqueóloga Valdirene do Carmo Ambiel defendeu sua dissertação de mestrado no Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, em um trabalho que envolveu a exumação dos restos mortais dos três nobres e exames do material em equipamentos da Faculdade de Medicina. 

Nos próximos anos, ainda haverá mais análises em cima dos exames feitos com a família imperial. O diálogo entre medicina e arqueologia cria espaço para um campo de pesquisas ainda pouco explorado no país – a arqueopatologia, que estuda doenças a partir de vestígios do passado. 

“Isso não é a área de ninguém. A gente vai ter que aprender a fazer isso”, afirmou Paulo Saldiva, professor do departamento de patologia da Faculdade de Medicina. 

     No Hospital das Clínicas da USP, as ossadas de D. Pedro I e D. Leopoldina, e a múmia de D. Amélia passaram por exames de imagens como tomografias, radiologias e ressonâncias magnéticas capazes de revelar aspectos da vida e da morte deles. Além disso, partes dos tecidos dos nobres foram retirados para análises genéticas que ainda precisam ser concluídas. 

   D. Pedro I, por exemplo, fraturou quatro costelas do lado esquerdo, o que prejudicou o funcionamento de seus pulmões – ele morreu de tuberculose, doença que ataca justamente esses órgãos. Já D. Leopoldina não tinha nenhuma fratura nem na perna nem na bacia, o que enfraquece a hipótese de que ela teria sido morta pelo marido – uma lenda histórica afirmava que D. Pedro I a teria empurrado escada abaixo. 

   Mas Saldiva ressaltou que “não precisa ser VIP” para se tornar objeto de estudo com a aplicação dessa tecnologia. Segundo o professor, os mesmos exames já foram feitos em um fóssil de jacaré coletado por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (SP) (Unicamp), que queriam saber mais sobre a locomoção dos animais. 

   E a técnica poderia ajudar a contar, ainda, outros capítulos da história do Brasil. “Um sambaqui [cemitério indígena], por exemplo, pode revelar as doenças que os europeus trouxeram para os índios”, sugeriu. 

   Mesmo levando em conta somente os exames já realizados com a família imperial, eles ainda devem render mais estudos. “O dado que já está colhido permite muito mais do que já foi feito até agora”, apontou Edson Amaro Júnior, professor do departamento de radiologia da Faculdade de Medicina da USP.


Relevância 

     De acordo com Astolfo Gomes de Mello de Araújo, professor de Arqueologia do MAE/USP e um dos orientadores do trabalho de Valdirene, a exumação dos corpos de parte da família real brasileira é importante para entender melhor o período imperial que o país viveu, que, segundo ele, é tratado com relativamente pouca relevância. 

    “O Brasil, de uma maneira geral, tem uma memória histórica curta (...) O trabalho mostrou que havia ali dados importantes, além de derrubar a dúvida de que ali pudessem não estar enterrados os restos mortais”, disse Araújo, referindo-se ao Monumento da Independência, cripta imperial localizada em São Paulo, onde estão as urnas funerárias. 

   Ele disse que medalhas e comendas que foram enterradas com D. Pedro I foram recuperadas durante a análise das urnas funerárias. Segundo o professor, esses materiais passam por restauração e estão atualmente em posse do Departamento do Patrimônio Histórico da Prefeitura de São Paulo. “Esse material foi recolhido e deve ser exposto”, explica. 

   O orientador ressaltou ainda a importância da obtenção das autorizações para a exumação, tanto de integrantes da família real brasileira, quanto do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). 

    “Que isto sirva de exemplo até para outros países, onde há cada vez mais tabu em relação ao estudo de restos humanos (...) As pessoas acham que os restos mortais não podem ser manipulados. Isso é um retrocesso total, porque ali há informações importantes. Os restos humanos são tratados com respeito”, disse.



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