Vestígios encontrados num sítio arqueológico sul-africano indicam
que, 500 mil anos atrás, ancestrais do homem já tinham desenvolvido a
tecnologia arquetípica dos caçadores pré-históricos -lanças com pontas de
pedra.
Ou seja, nessa
época remota, a ideia aparentemente simples de unir um pedaço de pedra
trabalhado a um cabo de madeira já tinha emergido, o que significou o primeiro
passo para formas revolucionárias de hardware: machados, martelos e enxadas
(essas bem mais tarde), por exemplo.
A descoberta está
descrita na edição de hoje da revista especializada "Science", em
artigo cuja autora principal é Jayne Wilkins, da Universidade de Toronto
(Canadá).
Além da análise detalhada dos artefatos originais, Wilkins e
companhia fizeram até um pouco de arqueologia experimental. Criaram réplicas
das pontas de pedra para ver se elas davam mesmo boas extremidades de lança, o
que de fato parece ocorrer.
Da mão ao cabo
A sacada de
adicionar um cabo à pedra trabalhada pode parecer óbvia, mas demorou um tempo
surpreendentemente longo para iluminar a caixa craniana dos hominídeos, como é
conhecida a linhagem humana (dos ancestrais mais remotos até hoje).
Embora os
primeiros exemplares de ferramentas de pedra -basicamente seixos com pontas
afiadas- tenham surgido há mais de 2 milhões de anos, por muito tempo elas
parecem ter sido usadas com as mãos nuas.
Eram coisas como
raspadores, perfuradores e os chamados machados de mão (que provavelmente não
cortavam árvore nenhuma, apesar do nome).
Acredita-se que
esses hominídeos mais primitivos dependessem relativamente pouco da caça. Sua
principal fonte de proteína e gordura animal teriam sido carcaças de grandes
mamíferos abatidos por predadores do topo da cadeia alimentar, como leões e
dentes-de-sabre.
Antes da
descoberta na África do Sul, uma das pistas mais antigas do momento em que os
hominídeos passaram a assumir um papel mais ativo na busca por grandes presas
tinha 400 mil anos -lanças inteiramente de madeira achadas na Alemanha.
Wilkins e seus
colegas acharam as mais de 200 pontas de lança, com tamanho médio de 7 cm no sítio arqueológico de
Kathu Pan 1, no interior da África do Sul. A primeira suspeita sobre o uso dos
artefatos veio do padrão de fragmentação nas extremidades deles, que sugeria a
trombada contra um alvo.
Encaixe
Dois outros
indícios sugeriam o uso em lanças. O mais crucial era a remoção de lascas de
pedra no local onde, teoricamente, o cabo ficaria -provavelmente para facilitar
a fixação da madeira.
Além disso,
sabe-se que instrumentos de pedra que são usados para cortar coisas, e não para
perfurá-las, apresentam um padrão típico de desgaste quando são usados por
muito tempo.
Eles vão ficando
menos e menos simétricos conforme vão sendo afiados -um lado fica maior que o
outro, em resumo. E esse tipo de assimetria não foi identificado nas prováveis
pontas de lança.
O último teste,
desta vez experimental, envolveu colocar pequenos cabos em réplicas das pontas
de pedra, presos a elas com resina de acácia (árvore comum na savana africana)
e tendão de animais, uma técnica provavelmente próxima da que estava sendo
usada no passado.
Essas pontas
foram acopladas a bestas (a arma de origem medieval, da "família" dos
arcos, disparada com um gatilho), que permitiam regular com precisão a força do
golpe. E se mostraram capazes de penetrar com eficiência carcaças de gazela,
sofrendo poucos danos.
A aposta dos
cientistas, a julgar pela idade dos vestígios, é que seus criadores tenham sido
da espécie Homo heidelbergensis. Eram hominídeos de cérebro já avantajado,
considerados os ancestrais tanto do Homo sapiens quanto dos neandertais.
http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/1186264-grupo-acha-primeiras-lancas-do-mundo.shtml
Nenhum comentário:
Postar um comentário